Introdução
Neste artigo, abordarei descobertas comuns em due dligence e auditorias técnicas operacionais e as melhores práticas que podem ser implementadas para otimizar as operações dos provedores de internet. Além disso, destacarei o papel essencial do advogado especializado em telecomunicações nesse processo, assegurando que os contratos e a prática estejam alinhados para evitar riscos e garantir a conformidade, isso é cada vez mais necessário neste dinâmico e competitivo setor de telecomunicações e banda larga fixa, onde a saturação de mercado é evidente, a eficiência operacional não é apenas uma vantagem competitiva, mas uma necessidade dos provedores de serviços de internet (ISPs).
Auditoria vs. Due Diligence
Para fins deste artigo, é importante diferenciar auditoria técnica e operacional de due diligence técnica operacional:
Auditoria Técnica e Operacional: É quando um ISP contrata uma auditoria para revisar seus registros, operações, processos e desempenho. O objetivo é identificar e corrigir áreas de não conformidade, melhorar a qualidade de atendimento e eficiência operacional com base nos pontos levantados pela auditoria.
Due Diligence Técnica Operacional: É solicitada por um terceiro interessado, geralmente em transações significativas como fusões e aquisições, ou aporte de recursos financeiros. Este processo envolve uma investigação detalhada da operação do ISP para avaliar a viabilidade, os riscos e sinergias antes de uma transação.
O Papel Crítico do Advogado em Due Diligence Técnica Operacional
Em um cenário de mercado aquecido, com previsões de movimentações de fusões e aquisições, é crucial que os ISPs, sejam eles potenciais compradores ou vendedores, estejam totalmente preparados para qualquer avaliação. Tanto a Due Diligence quanto a Auditoria técnica operacional, essencial para este preparo, exige a colaboração de um time multidisciplinar no qual o advogado especialista em telecomunicações e fusões e aquisições (M&A) desempenha um papel fundamental. Este profissional é responsável por analisar contratos como os de Conectividade (Trânsito IP e L2L); SWAP (Infraestrutura, Capacidade, Portas FTTh); IRU, Direito de Uso; Redes Neutras; Locação de PoP(s) e Datacenter(s); Colocation; Construção Conjunta de Rede; Fornecedores de Conteúdo (CDN, SVA, MVNO); Compartilhamento de Infraestrutura (Postes, Dutos, etc.); Licitações; Contrato com clientes (B2C e B2B); Last Mile, entre outros, verificando a adequação entre as cláusulas contratuais e a realidade fática. É essencial que as análises de redes e operações sejam embasadas em dados sólidos. Por isso, é crucial manter a comunicação constante entre todas as equipes, garantindo um entrosamento que permita a realização de cruzamentos estratégicos e a obtenção de diagnósticos finais precisos.
Descobertas Comuns em Auditorias
Discrepâncias entre Documentação e Realidade Operacional:
Frequentemente, as operações práticas dos ISPs diferem significativamente das descrições em documentos oficiais. Tais discrepâncias podem abranger desde simples erros de atualização de documentação até graves casos de não conformidade com as normas.
Postes: Muitos ISPs têm postes não legalizados junto à concessionária de energia, o que representa um risco operacional e regulatório. Não só uma análise de volumetrias se faz necessária, como também entendimento das cláusulas destes contratos para dimensionamento do passivo e multas em caso de aplicação da regulamentação contra a empresa. Além disto, os históricos das renegociações de valores precisam ser levados em conta, para garantir que alguma liminar provisória, sem o conhecimento do investidor, seja derrubada, gerando multas retroativas e aumento do OpEx com compartilhamento de infraestrutura.
Conectividade:
Em um M&A este tema normalmente é uma das principais linhas de sinergias e que deve ser obtida por todo o investidor, as análises contratuais permitem além de dimensionar os valores de reduções em OpEx com conectividade, prever o tempo e esforço necessário para concretizar este ganho, através das vigências, condições técnicas contratuais versus operacionais com os fornecedores, em muitos casos permitindo o encerramento dos acordos sem necessidade de pagamento de multa de recisão. Além dessas sinergias, existem riscos e problemas como capacidades contratadas que não refletem as necessidades atuais do ISP, alta dependência de burst (excedente) sem o amparo contratual, SLAs elevados e outros fatores podem levar a desafios significativos na gestão de tráfego e consequentemente na satisfação do cliente.
IRU e SWAP:
Locação de PoP(s) e Colocation: Discrepâncias frequentes entre as especificações de locação contratadas e as instalações reais podem causar problemas como falta de espaço ou recursos inadequados para operações eficientes. Além disso, já foram encontradas situações como goteiras em cima dos equipamentos instalados no Rack, o que coloca em risco a integridade dos equipamentos e pode causar falhas de rede significativas. A migração desses ambientes normalmente é um processo complexo que não ocorre rapidamente. Por isso, o ideal é que todos esses ambientes estejam formalizados e com vigência suficiente para que, caso seja necessário, o investidor possa realizar ajustes em tempo adequado, sem impactar a operação e os clientes.
Acordos Verbais Não Formalizados:
É comum ISPs dependerem de acordos verbais para operações rápidas e flexíveis. Entretanto, esses acordos, quando não documentados, podem levar a interpretações divergentes entre as partes, resultando em conflitos e dificuldades legais em situações de auditoria ou transição corporativa. O que torna ainda mais grave é que em muitos casos essa falta de formalização está relacionado a itens críticos de backbone como Rede SWAP, Construções Conjuntas, Conectividade Compartilhada etc.
Os acordos de SWAP desequilibrados, onde um lado recebe a fibra óptica (F.O.) enquanto o outro conectividade por exemplo, parceria que não tem longevidade visto que os preços de mbps estão em quedas constante e o lado que cede infraestrutura normalmente sente-se lesado neste tipo de parceria depois de um certo tempo, podem resultar em ineficiências operacionais e conflitos futuros com parceiros, especialmente quando as condições de rede ou valores de mbps mudam rapidamente. Além disso, alguns destes acordos com este tipo de troca e compromissos não estão alinhados com normativas e legalidades do setor.
Contratos Desatualizados:
Muitos ISPs enfrentam desafios operacionais devido a contratos que não foram atualizados para refletir mudanças nas práticas de negócios ou na tecnologia. Essas restrições podem limitar severamente a capacidade de resposta a novas oportunidades de mercado ou exigências regulatórias. Compartilhamento de Infraestrutura (Postes, Dutos etc): Limitações no acesso ou uso inadequado de infraestrutura compartilhada, como postes e dutos, são problemas comuns que podem afetar a capacidade de expansão e a manutenção da rede. Falta de formalização de Direitos de Uso, o que pode levar a disputas legais e sanções regulatórias. A regularidade e conformidade com normas técnicas e de segurança muitas vezes não são atendidas, resultando em riscos de multas e a necessidade de ajustes operacionais significativos. Problemas de gestão e manutenção, como sobrecarga de infraestrutura e documentação inadequada ou imprecisa, complicam a gestão eficiente dos ativos e podem prejudicar as operações diárias e planos de expansão. Adicionalmente, em situações de aquisição de um ISP por outro, a transferência correta dos direitos de uso dos postes pode ser negligenciada, criando complicações legais e operacionais. Links sem contrato vigente podem ser cortados a qualquer momento sem penalidades contratuais, representando um risco significativo para a continuidade do serviço. Além disso, é comum encontrar POP(s) sem contrato de locação vigente, o que pode resultar em despejos e interrupções de serviço.
Melhores Práticas para Eficiência Operacional:
Para evitar essas e outras questões, e garantir a eficiência e conformidade, as seguintes práticas são recomendadas:
Implementação de Indicadores: Estabelecer métricas específicas e mensuráveis para monitorar o desempenho operacional e identificar áreas de melhoria contínua, comparar com benchmark de mercado e ajustar as ineficiências.
Monitoramento preditivo e 24x7: Utilizar tecnologias avançadas para prever possíveis falhas e garantir monitoramento constante das operações, permitindo ação proativa, diminuindo custos e aumentando a satisfação dos clientes.
Sistemas e ferramentas de automação: Implementar soluções tecnológicas que automatizem tarefas repetitivas e aumentem a eficiência operacional, reduzindo erros e tempo de execução.
Contratação de profissionais multi skills: Recrutar e desenvolver talentos que possuam habilidades diversas, facilitando a flexibilidade operacional e a resolução de problemas complexos de forma integrada.
Definições de metas setorizadas e abrangentes: Estabelecer objetivos claros e específicos para cada área da operação, alinhados com metas globais da organização, promovendo direcionamento e foco.
Política de bonificações internas: Implementar um sistema de recompensas que reconheça e incentive o desempenho excepcional, bem como a contribuição para a eficiência operacional e a conformidade.
Integrações sistêmicas (ERP, CRM, Gestão de Redes e Monitoramento): Integrar os sistemas de gestão empresarial (ERP), relacionamento com clientes (CRM), gestão de redes e monitoramento para melhorar a coordenação e a visibilidade das operações em toda a organização.
Conclusão
A implementação de boas práticas operacionais e a realização regular de auditorias técnicas constituem a espinha dorsal para a manutenção da conformidade regulatória e a eficiência operacional em todo o setor de ISPs. Essenciais para todos os envolvidos — seja no processo de venda, compra ou mesmo durante fusões — estas práticas fortalecem as operações existentes, e também preparam as empresas para serem parceiros ou alvos mais atraentes em qualquer transação futura. Portanto, independentemente de seu objetivo atual no mercado de ISPs, adotar uma abordagem rigorosa à due diligence técnica e à auditoria é fundamental. Este artigo serve como um guia fundamental para todos os atores do setor, fornecendo as ferramentas necessárias para navegar com sucesso por um ambiente de negócios em constante evolução e cada vez mais regulamentado.
Publicado em: https://ispmais.com.br/#flipbook-df_711/32/